Historiadora resgata cartas trocadas entre Fritz Müller e importantes cientistas do século 19

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Ana Maria Ludwig Moraes fala aos convidados na noite de lançamento

 

Texto e entrevistas: Claus Jensen 

No dia 1º de setembro, a historiadora e pesquisadora Ana Maria Ludwig Moraes lançou um trabalho inédito, com ampla colaboração para o meio científico. O lançamento aconteceu na Fundação Cultural de Blumenau, em evento fechado para convidados, um deles, nós do site OBlumenauense. No local havia vários painéis com os textos que estão impressos em um livreto.

 

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A Exposição “Fritz Müller: a genialidade venceu a floresta” foi aberta no Shopping Neumarkt para visitação nesta segunda-feira (5), onde fica até o dia 25 de setembro. Depois segue para o Mausoléu e a Biblioteca da Furb. Um projeto fantástico que vale a pena conhecer nas próximas linhas.

Depois de 40 anos guardados no arquivo histórico de Blumenau, foram traduzidas cartas escritas em alemão, que relatam a correspondência de Fritz Müller com diversos cientistas e pesquisadores do século 19.

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Sueli Petry

O projeto teve apoio de duas instituições alemãs: a Universidade de Bonn e do Museu Alexander Koenig de Pesquisa de Zoologia (ZFMK). Além disso o Instituto Histórico de Blumenau e do Arquivo Histórico José Ferreira da Silva. A proposta era desvendar um aspecto da vida do naturalista que é pouco conhecido: o de que não foi apenas colaborador de Darwin, seu admirador mais ilustre. “São treze cientistas, notáveis em suas épocas, tanto pelos trabalhos que desenvolveram quanto pelas posições que ocuparam como curadores, diretores, pesquisadores e professores de instituições até hoje reconhecidas pela contribuição que deram à ciência”, comenta Sueli.

A troca de informações entre os cientistas era feita por meio de cartões postais, que foram escaneados, transcritos e traduzidos. Na exposição, o público poderá conferir em banners e painéis um pouco da biografia e fotos de alguns dos cientistas, além das mensagens escritas. Para auxiliar o visitante será disponibilizado um guia de aproveitamento. “Um folheto vai indicar o que deve ser observado, como por exemplo os carimbos, onde é possível verificar o tempo que levava para chegar a correspondência. Assim como o conteúdo das mensagens, que muitas vezes sugeria o envio de espécimes como borboletas vivas e sementes de plantas”, explica Ana Maria.

A diretora de Patrimônio Histórico e Museológico da Fundação Cultural de Blumenau, professora Sueli Petry; disse que as cartas estavam guardadas com muito cuidado em uma pasta, porém ignorados pela sociedade. Elas foram doados pelos descendentes da família Müller há mais de 40 anos. “Eu sempre olhava esses cartões refletindo sobre os questionamentos que esses pesquisadores faziam para Fritz Müller. Isso tudo é altamente relevante. O fato de termos acesso a esse material depois de quase 150 anos, é motivo de muita satisfação. É a primeira vez que eles são pesquisados e traduzidos, o que nos permite rever e estudar, sobre o mundo científico na botânica e ciência do século 19”, relata. Ela lembra que Fritz vivia no meio do mato, como era Blumenau na época, correspondendo-se com expoentes do mundo científico europeu.

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Fritz Mueller, um homem muito a frente do seu tempo.

O projeto começou em 2012, quando Ana conseguiu recursos para o projeto, através do Fundo Municipal de Cultura, quando fez a transcrição e tradução dos cartões. Em 2015, com novos recursos provenientes do mesmo fundo, foi realizada uma nova revisão do material, desta vez com aprofundamento dos termos científicos e biografia dos remetentes. “A partir daí, consegui montar uma equipe de tradutores, revisores e designer gráfico, para que pudéssemos disponibilizar à população esse material. É um presente para Blumenau” lembra a historiadora.

A primeira parte do trabalho foi escanear as correspondências, que foram escritas em alemão e não tinham o nome do remetente, apenas a assinatura. “Nós tivemos um período de identificação dos remetentes, quando estudamos a grafia, já que nós só tínhamos as assinaturas, não os nomes. Depois de identificá-los, eu precisava de uma pesquisa aprofundada e com credibilidade, porque eu só tinha algumas referências de internet. Então eu conheci o pessoal da universidade de Bonn em um evento no Rio de Janeiro em 2014. Eles se tornaram parceiros na identificação dos remetentes, afinal eles também tinham interesse nesse material. Como veio em alemão, ele foi traduzido para o português pela Sra. Selma Rutzen. Então consegui ter todo o material com fontes fidedignas para que eu pudesse elaborar e disponibilizar ao público” relata Ana Ludwig.

A historiadora lembra que entre os colaboradores de Fritz Müller, estava o seu irmão August, que veio com ele em 1852. Ele tinha outros como o Hermann e William (meio irmão), que continuavam na Alemanha. Segundo Ana, o papel de William foi muito importante, porque possivelmente Fritz pediu sementes para dar aos colonos de Blumenau trabalharem.

 

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Luiz Roberto Fontes ao lado de Ana Maria Ludwig Moraes

 

Outra pessoa fundamental para o projeto foi o professor Luiz Roberto Fontes, biólogo e médico legista, de São Paulo. Ficou a cargo dele pesquisar os nomes científicos das plantas e revisar alguns termos de época. Não foi tarefa fácil entender o significado a partir dos cartões manuscritos, até porque a tradutora não é técnica no assunto.

Fontes disse que os nomes nem sempre deixavam claro se eram plantas ou animais, e o que significavam em linguagem atual. Além disso, muitos estavam escritos em um alemão manuscrito muito antigo e com letra difícil de entender. “Foi um grande desafio encontrar a correspondência do termo atual para certos nomes populares no século 19. Por exemplo a cocosele von calabrian, que tem outros similares e no final é a semente de abobrinha” relembra.

O primeiro contato do biólogo com o projeto de Ana, foi em outubro de 2015, quando participou do SEPACEB (Seminário do Patrimônio Cultural Edificado de Blumenau) falando sobre cupins. “O trabalho mais intenso aconteceu nos últimos seis meses, que foi longo e difícil” finaliza Fontes, que recebeu todo material digitalizado por e-mail.

Ana Maria Ludwig Moraes disse que o trabalho de pesquisa não termina nessa fase, e a ideia é transformar esse projeto em um livro. “Eu quero estudar o Fritz Müller como pessoa, já que estuda-se sua produção científica, mas ele teve uma importância também como formador do pensamento catarinense. Em Florianópolis, Fritz foi professor dos intelectuais catarinenses do século 19. Então quero aprofundar esse estudo sobre o que mais ele fez não só em Santa Catarina, mas como interlocutor de Darwin” conclui a historiadora.

 

Fotos do evento de lançamento.

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Exposição no Shopping Neumarkt

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